Clóvis de Faria Alvim
Ocupou a Cadeira 17, no período de 22/11/1970 até 29/08/1979.
Nasceu Clóvis de Faria Alvim em Itabira, MG, em 1920. Neto do primeiro governador de Minas Gerais, José Cesário Alvim, nomeado pelo Marechal Deodoro da Fonseca, em 1889. Sua família se destacava na vida cultural, social e política do Estado. Na infância residiu na fazenda da Fábrica da Gabiroba, de propriedade de seu pai, onde fez seus primeiros estudos. Em 1945, graduou-se na Faculdade de Medicina da Universidade de Minas Gerais onde defendeu tese de Livre-Docência em psiquiatria, intitulada Introdução ao Estudo da Deficiência Mental. Seu trabalho notabilizou-se não somente na psiquiatria, mas também na etnopsiquiatria, na história, na psicopedagogia, na psicanálise, além de notabilizar-se como grande escritor e cronista. Entre seus mais importantes trabalhos está uma pesquisa sobre o nível mental e a personalidade dos índios pré-colombianos do Vale do Rio das Velhas. Outro de seus trabalhos mais extraordinários foi a pesquisa de campo efetuada no Alto Xingu sobre a vida sexual dos índios brasileiros e os seus costumes após o nascimento dos seus filhos (curumins). Clóvis Alvim, como era carinhosamente chamado, descobriu que havia nessas tribos um hábito cultural também encontrado em sociedades indígenas de outros países e continentes. Trata-se da “couvade”, o fenômeno bio-psico-social no qual, após o parto, a índia mãe vai para a lavoura plantar e colher os alimentos da tribo. O pai, por outro lado, deita-se na rede e se mantém de repouso por, pelo menos, três semanas recebendo todos os cuidados da tribo, inclusive a alimentação própria de uma pós-parturiente. O autor descreveu magnificamente este costume em dois de seus trabalhos: Alguns aspectos da vida sexual dos índios brasileiros, de 1958, e Psicose puerperal, publicado em 1971. Também escreveu sobre a endemia bócio-cretina na linguagem popular do Brasil-Central, o fanatismo religioso e o folclore das prisões.
Clóvis Alvim foi um erudito, homem de cultura enciclopédica e autor de várias publicações científicas. Era mais um teórico que um clínico. Entre seus trabalhos publicados, estão: Um caso de esclerose tuberosa, Um precursor mineiro da psiquiatria brasileira, O jovem Freud, O pensamento evolucionista em neuropsiquiatria, Assistência ao doente mental, Viagem ao Brasil em 1896 (tradução), de Jorge de Caux, e vários artigos em jornais e revistas. Era conhecida sua verve humorística, trazia sempre uma pitada humorística quando se referia aos mais diversos temas, desde a política, a ciência, a medicina, a sociedade e a cultura brasileiras. Uma de suas frases mais famosas foi: “A psiquiatria é muito bonita, o que a atrapalha é o paciente”, revelando o quanto se interessava pelas teorias e como, muitas vezes, por melhores e mais brilhantes que fossem as concepções e pensamentos filosóficos-conceituais sobre determinado transtorno mental, havia sempre um caso clínico a desafiar e contradizer a teoria. Em 1980, após sua morte, foi lançado Escritos Bissextos,513 livro que conta histórias – escritas pelo próprio Clóvis Alvim – sobre Itabira e seus personagens, o cotidiano das pessoas que viviam nesse município, a Fábrica da Gabiroba, além de uma parte específica sobre Helena Antipoff.
Clóvis Alvim foi professor Livre-Docente na Cadeira de Psiquiatria da Faculdade de Medicina de Minas Gerais, quando defendeu a tese Introdução ao Estudo da Deficiência Mental. Também foi Professor de Psiquiatria na FCMMG. Em ambas faculdades trabalhava ao lado de seu amigo de sempre Paulo Saraiva. Compunham uma dupla que, diz o folclore, quando alguém perguntava a Paulo Saraiva quem era o melhor psiquiatra de Minas Gerais recebia incontinenti a resposta: Clóvis Alvim. Quando perguntado a este último quem era o melhor psiquiatra de Minas, a resposta era invariável: Paulo Saraiva. Foi colaborador muito próximo da educadora Helena Antipoff, no cuidado à criança e ao adolescente excepcionais ou superdotados. Na Fazenda do Rosário administrava cursos de psiquiatria infantil para professoras e pedagogas de todo o estado de Minas e de outros estados. Atendendo à demanda da instituição, escreveu uma de suas maiores obras, o Vocabulário de Termos Psicológicos e Psiquiátricos, que até hoje tem sido de grande utilidade para públicos de diversas áreas médicas e não-médicas. Preparava-se para escrever um livro sobre a biografia da excepcional educadora russa e que se naturalizara brasileira, mas não foi autorizado pela mestra em função de sua proverbial modéstia e recato. Tal obra foi escrita alguns anos mais tarde por seu filho Daniel Antipoff, que se utilizou de inúmeros textos escritos sobre sua mãe produzidos pelo incansável Clóvis de Faria Alvim. (Ver Anexo 5). Em sua carreira Clóvis Alvim foi médico da Fundação Estadual de Assistência Psiquiátrica e do Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social. Participou de numerosos congressos de sua especialidade. Entre outras instituições, também trabalhou no Serviço de Antropologia Criminal da Penitenciária Agrícola de Neves, no Instituto Pestalozzi, no Hospital de Psiquiatria Infantil. Nos últimos anos de sua vida, Clóvis Alvim passou por dissabores de ordem política. Em artigo publicado em 1958 sobre o Hospital Colônia de Barbacena, ele já havia feito severas críticas à forma pela qual o nosocômio era administrado pelo Estado, tendo se tornado um depósito de pacientes psiquiátricos e não podia ser considerado um hospital psiquiátrico. Passou, então, a ser visto com reservas por certos grupos de políticos do Estado. Em meados da década de 1970, escreveu artigo de grande repercussão no jornal Estado de Minas abordando a questão das enormes filas de pacientes que aguardavam atendimento no Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS). Alguns casos de morte por doenças de pacientes que estavam nas filas causaram grande comoção e revolta popular. Clóvis Alvim, como psiquiatra do INAMPS, conhecia de perto o drama desses pacientes e, em seu artigo, além de tecer as críticas pertinentes, digase de passagem, apontava algumas soluções para as mesmas. Foi o bastante para despertar a ira de seus inimigos políticos que forçaram sua demissão do Serviço Público. Não o conseguindo, levaram-no à aposentadoria ainda precoce por incompatibilidade com a administração do período. Este fato levou-o a um estado depressivo do qual nunca se recuperaria completamente. Clóvis Alvim faleceu, em Belo Horizonte, em 29 de agosto de 1979, uma hora antes de proferir mais uma de suas brilhantes palestras no Centro de Estudos Austregésilo Ribeiro de Mendonça, da Casa de Saúde Santa Maria. Deixou um vazio entre seus pares, seus amigos e ex-alunos que até hoje não foi preenchido.